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segunda-feira, 4 de maio de 2009

Café

                Aquela sensação era muito estranha, ele sentado à mesa do café da manhã, ela na cozinha, com um silêncio matinal pairando na atmosfera do pequeno apartamento. O café quente, feito por ela, retribuído apenas com um sorriso amarelo; o pão comprado por ele, fatiado sem cuidado, retribuído apenas com o trocado. Cada gole revelava apenas um momento de desconforto, onde nenhuma palavra cabia.

                A noite anterior, monótona e acompanhada por filmes ruins, fora semelhante. Entre cada fala do script, a vergonha de se comunicar, de se entregar, mostrava a sintonia dos dois.  Dormiram em camas separadas; ele na sala, ela no quarto, mas o vazio na cama de ambos dava-os um aperto por dentro.

                Enquanto ela fazia mais café na cozinha, ele examinava a xícara vazia. O leite derramado da leiteira, coberto com preguiça por guardanapos, pingava no chão, como um metrônomo contando os compassos de pausa em uma orquestra descuidada. Ambos chegaram até ali, planejaram chegar até aquele momento, porém todas as semanas passadas previam algo melhor, um casal feliz. Talvez a diferença estivesse ali: não planejaram continuar amigos, só ser um casal. Enquanto a cafeteira era posta na mesa, o silêncio inquieto daquela manhã acordou os dois.

2 comentários:

Capitu disse...

Ah, o silêncio.. Tão enigmático sempre. Sempre diz tudo, no mero nada. Vai entender.. Viciada nele, agoniada com a existência dele.

Cacau disse...

não sei se foi a intenção, mas lembrei da minha teoria sobre intimidade.