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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Este lado do paraíso

Este lado do paraíso - F. Scott Fitzgerald

 

- Prossiga. Sou um bom ouvinte hoje.

- As pessoas se esforçam demais para acreditar em líderes hoje em dia... esforçam-se demais, lamentavelmente. Mas assim que surge um reformador popular, um político, um soldado, um escritor ou um filósofo, um Roosevelt, um Tolstoi, um Wood, um Shaw, um Nietzsche, as contracorrentes da crítica o repelem. Deus do céu, homem algum pode aguentar, em nosso tempo, a preeminência! É o caminho mais certo para a obscuridade. As pessoas se cansam de ouvir e repetir incessantemente o mesmo nome.

- E você culpa a imprensa por isso?

- Inteiramente. Olhe para você. Trabalha na redação do The New Democracy, considerado o semanário mais brilhante do país, lido por homens que fazem as coisas e tudo mais. E qual é a sua função? Ser o mais inteligente, o mais interessante e o mais brilhantemente cínico possível, a respeito de todo homem, de toda doutrina, de todo livro, de toda concepção política de que lhe compete tratar. Quanto mais forte a luz, quanto maior o escândalo que se lança sobre o assunto, mais dinheiro lhe pagam, maior é o número de pessoas que compram o jornal. Você, Tom D’Invilliers, um Shelley gorado, mutável, vário, esperto inescrupuloso, representa a consciência crítica da raça... Oh, não proteste! Conheço a coisa! Eu costumava fazer crítica literária na universidade; considerava extremamente divertido referir-me ao mais recente, honesto e consciencioso esforço de alguém no sentido de propor uma teoria ou um remédio como “uma contribuição bem-vinda às nossas leituras ligeiras de verão.” Vamos, admita que é assim!

Tom sorriu e Amory continuou, triunfante:

- Queremos acreditar. Jovens estudantes procuram crer em autores mais velhos, eleitores procuram crer em seus representantes no Congresso, países procuram crer em seus estadistas... mas não podem! Há demasiadas vozes, demasiada crítica irrefletida, ilógica, dispersa. É pior ainda nos casos dos jornais. Qualquer grupo rico, antigo, retrógrado, dotado dessa forma de mentalidade particularmente envolvente, aquisitiva, conhecida como gênio financeiro, pode possuir um jornal que seja o alimento intelectual de milhares de homens fatigados, apressados, demasiado envolvidos na vida moderna, e que não engolem outra coisa além de alimentos pré-digeridos. Por 2 centavos o leitor compra a sua política, os seus preconceitos, a sua filosofia. Um ano depois, há um novo tom político ou uma mudança na direção do jornal. Consequência: mais confusão, mais contradição, uma súbita irrupção de novas ideias, o seu afinamento, a sua destilação, a reação contra elas... – Fez uma pausa, apenas para tomar fôlego e prosseguiu: - E foi por isso que eu jurei não tomar de pena e papel até que as minhas ideias se aclarem ou me abandonem inteiramente. Já tenho na minha alma pecados mais do que suficientes sem meter na cabeça dos outros epigramas mais perigosos, superficiais. Talvez eu pudesse fazer com que um pobre inofensivo capitalista tivesse alguma ligação vulgar com uma bomba, ou fazer com que um bolchevistazinho inocente se visse envolvido com balas de metralhadora.

- F. Scott Fitzgerald, Este lado do paraíso

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