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segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Serrana – Parte III (Fim)

(parte Iparte II)

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O sargento Rubião planejou como conseguiria a arma, e então João Pardal daria um fim naquele diabo que desvirginara sua filha. Com dois homens seus, cujos nomes foram perdidos na história, Rubião Petrosky matara um assassino qualquer – cujo nome também foi perdido -, que atirara em outro depois de uma desavença decorrente de apostas em jogos de cartas, e incriminou Novembrino. Os três policiais prenderam o pistoleiro e como presente, roubaram-lhe o revólver de prata. Novembrino foi mandado à Capital, onde cumpriria dez anos pelo crime que não cometera. Rubião levou o pagamento a João Pardal que, alegremente, inaugurou seu novo revólver com o marido infiel.

Na cadeia, Novembrino comeu o pão que o diabo amassou. Cumprir cadeia por um crime que havia cometido é uma coisa, agora quando se é preso por engano, a prisão não é um purgatório, mas o próprio inferno. Ainda atrás das grades, Novembrino descobrira por um conhecido, preso um ano após ele, toda a armadilha arquitetada por João Pardal e o sargento. Dez anos de cadeia para roubar sua amada companheira? Alguém teria de pagar.

Na década enquanto Novembrino ficou encarcerado, João Pardal continuou trabalhando por algum tempo, mas enfim se aposentou. Voltou para a fazenda que sua mãe lhe dera e começou a criar animais. O revólver prateado ficou como uma relíquia de seus tempos antigos, mas como velhos hábitos não morrem, continuava andando armado e tomando seu mate admirando o por do Sol. No sétimo ano de cadeia de Novembrino, Rubião foi morto em uma troca de tiros durante um assalto a banco, fato que o pistoleiro descobrira ainda preso. Deus já tinha a alma desse pobre coitado, menos um para a justiça de Novembrino.

Finda a sentença, Novembrino retornou a Serrana. Assim que botou os pés na cidade, foi primeiro à igreja rezar e depois visitou o túmulo do Pe. Agostinho. Conseguiu uma arma nova com um antigo amigo e deu uma volta pela praça da cidade.

Na rua principal de Serrana, Novembrino parou em uma barbearia para cortar os cabelos e fazer a barba. Durante o corte, sentado na cadeira em frente ao espelho, deu uma olhadela para a rua e viu, caminhando sozinho, do lado oposto da estrada, João Pardal. Apalpou o revólver e puxou a capa que o barbeiro tinha colocado sobre seus ombros.

“Espera um pouco que tenho que matar aquele homem.” Disse Novembrino enquanto corria para a porta. Não se pode dizer que o barbeiro ficou assustado, pois já conhecia a fama de Novembrino.

Novembrino atravessou a rua, sem olhar para os carros que vinham, e acelerou o passo. A quase quinze metros de João Pardal puxou a arma e bradou:

“João Pardal, seu filho duma égua!”

Com o susto, João Pardal se virou e buscou sua arma. Não achou nada. Por algum motivo que não lembrava, estava desarmado. A única vez que saíra desarmado. Ao ver Novembrino, com o cano apontado em sua direção, puxou o primeiro homem que passava na calçada e colocou-o em frente ao seu peito.

“Vais pagar pelo que me fez, Pardal!” Continuo urrando Novembrino, como o próprio arauto do inferno.

O problema, é que João Pardal pegara o Seu Kawaji como escudo, um japonês de um metro e meio que vendia ovos. João tinha mais de um metro e setenta. Era um escudo demasiado ruim. Com o sangue nos olhos, Novembrino apertou o gatilho, pouco se importava com o japonês, pois Deus não deixaria que a bala acertasse um inocente em uma vingança justa. Dito e feito. A bala acertou a testa de João Pardal que caiu morto no chão. O japonês pálido, tinha se borrado todo, e a rua tinha parado para ver o acerto de contas. Novembrino guardou a arma e voltou à barbearia para terminar sua barba.

No mesmo dia, Novembrino foi preso novamente e mandado para a Capital. Dessa vez, eram dezoito anos de cadeia, mas por um crime que havia cometido. A justiça dos homens não era nada perto da justiça divina cumprida por Novembrino; que só ficou triste porque não conseguiu reaver seu Smith & Wesson prateado. Três anos depois, Novembrino morreu de tuberculose na cadeia.

A história de João Pardal e Novembrino ainda é contada em alguns cantos de Serrana. Ouvi-a pela primeira vez da boca de Francisco Batista, depois foi confirmada por outro serrano. Hoje, Serrana é uma cidade mais tranquila, os pistoleiros praticamente sumiram de lá, migraram para outras cidades mais interioranas, onde a justiça popular é mais presente que a jurídica.

-- FIM --

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