Páginas

sábado, 18 de junho de 2011

O poetinha

Chico era um cara malandro. Destacava-se da trupe da rua por um atributo desejado por muitos e dominado por poucos: tinha a melhor conversa com as meninas. O primeiro a começar com namoricos, sapecadas e afins. Ele tinha olhos verdes graúdos, boca fina, cabelo encaracolado caindo na testa e orelhas, e um nariz helênico reto. Na verdade, em algumas rodas poderia até ser considerado bonito.

Mas a razão de seu sucesso com as meninas passava longe da beleza. Chico adorava poesia, herdou o gosto da mãe que colecionava Drummond de Andrade, Quintana, Vinícius e alguns espanhóis traduzidos. Levava a poesia a sério e começou a escrever versinhos com dez anos. Riamos da cara dele com suas tolices, mas com o tempo foi tomando jeito, até que virou um bom poeta. Demasiado meloso, mas bom. O suficiente para as mulheres se derreterem. Descobriu isso na escola quando a professora de português pegou seu caderno - um aluno escrevendo enquanto a professora explicava, só poderia ser bobagem! – se surpreendeu e leu para a classe os versos rabiscados. As meninas fizeram aquele sonoro coro “óin...” Com isso, vislumbrou as possibilidades de um mundo trovador. A trupe também se aproveitava e comprava poemas para dar às suas paqueras.

Com o advento de seus poemas e de sua conversa, inventou sua técnica infalível. Após inúmeros poemas de amor – alguns repetidos, claro, mas como as presenteadas saberiam? – criou uma capacidade de improviso superior. Em poucos minutos conseguia criar pequenas estrofes que esvoaçavam saias. A tática era simples: andava com um bloco de anotações e uma caneta no bolso, sempre. Quando pegava ônibus e sentava perto de uma garota bonita, escrevia um poema para ela, entoando seus olhos, seu cabelo, pele ou pintas, entregava-o para a garota e conseguia um número de telefone em troca – nessa época não havia emails ou celulares, muito menos blogs. Como uma piada interna, ele não dava nome para a poesia, apenas um número. A primeira chamava-se #1, a segunda, #2, e assim por diante. Claro, nem todas lhe davam o telefone ou a graça de uma conversa, mas ele sempre entregava o poema e dava-lhe um número. Sempre.

Naquela época, Florianópolis era muito pequena. Chegava um ponto em que as garotas do bairro já estavam saturadas de xavecos em versos. Então, quando achávamos que ele sossegaria, o malandro pegava ônibus de outras freguesias só para conseguir novas paqueras.

Um dia, quando tínhamos, provavelmente, dezenove anos, Chico chegou triste. Jogara o bloco fora, sempre com a cabeça baixa em um cigarro pendurado nos beiços. Ele não fala o porquê, mas, como Floripa era menor que hoje, logo descobrimos...

***

Continua…

Um comentário:

Anônimo disse...

Parte dois é sacanagem hehe