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segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Da Lata

Maconha da lata

Hoje, em meio a cervejas e conversas nostálgicas, um amigo gaúcho falou:

“Cara, tenho várias decepções na minha vida... No futebol, por exemplo, é que nunca vi o Zico jogar ao vivo, mas quando o assunto é festejar... Nunca me perdoo por não ter fumado da lata...”

Sorri e falei, com a cara de gato que acabou de comer o periquito da família:

“É, valia a pena...”

Se você procurar na internet, vai achar informações facilmente sobre a história “da lata”, mas a maioria sobre o Rio e São Paulo. Saiba, porém, que muitas chegaram aqui nesse pedacinho de terra perdido no mar, e muito marmanjo fica com os olhos cheios de brilho e lágrimas quando se lembram dessa maravilhosa época verdejante. Como eu dizia antes, todos os detalhes podem ser obtidos na internet, mas naquela época, não sabíamos de todos os pormenores.

Reza a lenda que, na primavera – porque todas as novidades surgem na primavera - de 1987, um navio vindo de algum lugar da Ásia, nas primeiras histórias da Índia - ou até do próprio Demiurgo -, estava viajando rumo aos Estados Unidos com um carregamento peculiar e recreativo. Advertidos de que autoridades e Marinha Brasileira já sabiam do que se tratava essa formosa carga e que estariam a caminho de abordá-los, os marinheiros despejaram quase todo o carregamento de latas no mar. O carregamento? Dizem que cerca de 15 a 20 mil latas, recheadas com um quilo e meio de Cannabis sativa cada. Essas latas boiaram, calmamente, rumo à costa brasileira.

Mas o que essas maconhas enlatadas tinham de tão bom? Se hoje, a maconha brasileira não é de qualidade superior, na época, também não era. Então, de repente, surgem boiando no mar latas recheadas de maconha prensada com mel e glicose, e com uma qualidade incrivelmente superior a tudo que se conhecia em terras tupiniquins. E sabe-se lá quando surgiriam novas latas! Era um frenesi a procura por latas nas praias. Surfistas – que como se dizia na época: “nem todo maconheiro é surfista, mas todo surfista é maconheiro” - e mergulhadores passavam o dia no mar procurando uma maravilha cromada boiando rebentação adentro. Os tradicionais pescadores gancheiros, da área dos Ganchos em Governador Celso Ramos, desistiam de pescar, porque o que dava dinheiro, e felicidade, eram as latas, então só procuravam-nas. Músicas surgiam sobre as ingratas que só fumavam da lata, filhos eram feitos em bobagens embaladas por THC e horas foram perdidas mirando a rebentação.

E em um belo dia daquele novembro, com um calor escaldante entrando pela janela, um amigo aparece no portão de casa gritando:

“Beto, Beto! Consegui uma! Tava boiando na Praia do Cagão!”

Só posso dizer que abandonei minha cama em frente ao ventilador e o livro, qualquer que o tadinho fosse, que lia e desci correndo as escadas.

Balaço tão grande procurei por mais alguns anos antes de parar com essas canabáceas.

“Valia a pena” repeti ao meu amigo gaucho desafortunado.

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