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domingo, 23 de outubro de 2011

Maxine

Louise-Brooks

“Acabei com meu namorado, bebi garrafas de tequila, li pensamentos de artistas,... ahm...” Maxine parou para pensar e tomar fôlego em seu discurso cheio de razão. “Saí muito, fumei maconha, transei com um amigo... Sabe, aproveitei pra caralho.” Concluiu a frase colocando o cigarro na boca. Estava sentada daquele jeito fêmea fatal – não sei francês – de vestidinho preto, pernas cruzadas, o cotovelo apoiado no joelho e o corpo deslocado para frente.

Na verdade ela não tinha acabado com o namorado, ele que tinha acabado com ela. Mas era um golpe muito duro jogar isso em sua cara, principalmente depois de um discurso tão autoafirmativo.

“Maxi, você sabe que todo mundo faz isso, não?” Me senti o terapeuta, de novo.

“Ah, nem vem, nem passei pela fossa!” O cabelo chanel preto balançou ao falar. Ela tinha nome francês e por isso achava que tinha que parecer francesa. E se dava muito bem nessa tarefa.

“E porque você transou comigo?” Tive que jogar na cara dela.

“Ah, aquilo foi culpa da tequila e...”

“Solidão?” Sou um merda, mesmo.

Tenho que fazer uma pausa aqui. Sim, eu sou o amigo com quem ela transou. E transamos muito bem, por sinal. Muitas vezes a mulher é linda, tem pernas maravilhosas, lábios deliciosos, mas não acontece aquele encaixe, sabe? E sim, também foi culpa da tequila. Mas naquela noite, ela estava realmente um tesão.

“Vai à merda.” Só faltou um biquinho para parecer mais francesa.

“Tá bom... fui longe de mais.”

“É, foi mesmo.”

“Tá, mas o que tem tudo isso?” Eu nem lembrava porque caímos no assunto: a reviravolta de Maxine sobre o ex.

“Ah, sabe como é, você vive escrevendo sobre pessoas ao seu redor, né?”

Assenti sua retórica – em seus vastos significados.

“Então... você podia escrever um conto sobre mim, não?” Falou aquilo com o máximo de sua retórica – em seus vastos significados – fazendo um biquinho, enquanto segurava o queixo e soltava fumaça pelo canto da boca.

“Maxine, minha querida... O que eu vou escrever sobre isso tudo?”

“Ora, qualquer coisa...” Agora o biquinho virava um sorriso jovial. Ah, aqueles lábios vermelhos. “Como eu superei meu ex com uma vida muito louca, essas coisas...”

Odeio escrever algo porque alguém me pede, simplesmente odeio. É como quando o professor te fuzila com uma pergunta óbvia, que você saberia responder em qualquer outra hora, mas se esquece da resposta por causa da pressão do momento.

“E seu disser que não?” Me apoiei em meus joelhos, avançando com o corpo em direção a ela.

“Mas eu gosto tanto do jeito que você escreve e gostaria tanto de aparecer em uma história sua...” O sorriso jovial ficava sacana muito lentamente...

“Com uma condição, Maxine.” Ah, aqueles lábios vermelhos.

“Humm?” Ah, aqueles olhos de gata.

Com os dedos esticados, dei um tapinha em uma das alças do seu vestido, que caiu sobre o braço. Ela olhou indignada, mas não respondeu. Fiz a mesma coisa na outra alça. Ela jogou o cigarro fora. Permissão concedida. Sou um bosta mesmo. Mas agora ela não podia culpar a tequila ou a solidão, era puro tesão mesmo. E provar que aquilo era tesão dela, sem subterfúgios, por um produto que eu traficava, as letras, foi ainda mais tesão para mim. Mais que aquelas pernas, lábios e vestidinho preto.

E Maxine, querida, aqui está o texto que te prometi.

Sou mesmo um merda.

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